quinta-feira, 13 de setembro de 2012

"Pobre Vítima!" (3/3)

"Pobre Vítima!"(3/3)


3) Eu procuro uma compensação, e portanto, o alívio do meu sofrimento, encontrando um culpado. É assim que a vítima procura o seu carrasco. Alguma vezes ela encontra-o, ligando-se preferívelmente a pessoas que vão realmente fazê-la sofrer. Mais frequentemente, ela inventa-o. A partir do momento em que projeto inconscientemente a imagem do salvador sobre um ser amado, espero dele o alívio de antigas mágoas reprimidas - as quais surgirão à superfície no momento deste encontro! O «salvador» sendo evidentemente impotente para aliviar as mágoas e sofrimentos no mais íntimo da vítima, então ela atribui-lhe a responsabilidade, fazendo-o passar do estatuto de salvador para o de carrasco. O amor pode transformar-se em ódio e a vítima utiliza a sua profunda irritação contra o salvador deposto. A vítima tende sempre a oscilar entre queixar-se e encolerizar-se. Duas conclusões: primeiro, é colocando-se no papel de vítima, conscientemente ou não, que nós transmitimos o sofrimento. São as vítimas que procedem mal. Portanto, ninguém pode escapar a este impasse, por uma razão muito simples: é que é verdade que nós não  somos a origem do nosso sofrimento. Nós recebemos, na infância, as mágoas da nossa alma, e estas não foram reconhecidas. Por isso é que se torna difícil assumir no presente a nossa responsabilidade. Sejamos indulgentes connosco próprios: pode ser longo e nada fácil o caminho da maturidade. Ele consiste em tomar consciência que, mesmo que eu não seja a causa do meu sofrimento, a causa do meu sofrimento está em mim. E também o poder de me libertar. Deixamos de ser vítimas assumindo a responsabilidade: sou  eu que sofro, então sou eu que posso mudar isso.
Denis Marquet


«Vítima: carrasco num estado de impotência.
Carrasco: vítima num estado de omnipotência.

A omnipotência e a impotência 
são os dois opostos do verdadeiro Poder.» 
                                                               Tariq Demens

quarta-feira, 12 de setembro de 2012

"Pobre Vítima!"(2/3)

"Pobre Vítima!"(2/3)


2) Pela afirmação da minha irresponsabilidade, evito não apenas a culpabilidade (eu sofro mas não é culpa minha), mas também a dura tarefa de buscar em mim próprio as raízes do meu sofrimento. Porque pode ser doloroso olhar para o fundo de si próprio; confrontar as nossas sombras exige coragem. É, no entanto, a única maneira de curar-se verdadeiramente. Negar a minha própria responsabilidade proporciona-me uma impressão ilusória de alívio que acabo por pagar caro e imediatamente: o da impotência  total. Esta impotência é compensada frequentemente por uma busca de se tornar todo poderoso. A procura compulsiva do domínio sobre outros esconde muitas vezes uma vítima impotente.

(continua amanhã...)
Denis Marquet

terça-feira, 11 de setembro de 2012

"Pobre Vítima!" (1/3)


"Pobre Vítima!" (1/3)

A palavra vítima encobre uma realidade: se formos roubados ou assassinados, tornamo-nos em vítimas de  um delito ou de um crime violento. Ao atribuírem esta noção, que pertence ao foro judicial, a sociedade oferece-nos um reconhecimento triplo: primeiro que sofremos; segundo, que não somos responsáveis pelos nossos sofrimentos; e por fim, que um terceiro foi responsável e deve-nos uma compensação. No domínio jurídico, este modelo é necessário mas torna-se perigoso aplicá-lo no contexto psicológico. Não temos todos nós, uma tendência consciente ou inconsciente a colocar-nos no papel de vítimas?  Porque na realidade também podemos esperar um benefício em triplicado, que na realidade é um impasse triplo.
1) Ao mostrar o meu sofrimento, eu posso esperar que um terceiro venha aliviar-me. Não se sentindo responsável pelo seu sofrimento, a vítima espera secretamente pelo seu salvador: aquele que assumirá a responsabilidade no seu lugar. Muitos relacionamentos amorosos nascem de uma transação entre aspetos inconscientes: tu salvas-me e eu salvo-te. E alguns destes relacionamentos acabam porque os enamorados não souberam como ultrapassar esta negociação de auto-enganos. Porque, quando se trata do aspeto psicológico, ninguém salva ninguém. 

(continua amanhã...)
Denis Marquet